Equipamento que avalia animal por sons emitidos é aprovado em pesquisa.
Pesquisadores da Embrapa e da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) validaram um método de bioacústica para avaliação de comportamento de bovinos em pastejo e disponibilizaram um manual prático e detalhado com todos os procedimentos de coleta e análise de dados para o uso desta metodologia.
O material é inédito e de utilidade para pesquisadores e estudantes da área. A bioacústica, estudo dos sons produzidos pelo organismo do animal, é um meio eficiente e conhecido para a caracterização do comportamento de bovinos, porém, faltava um documento orientador para auxiliar na padronização do método durante sua aplicação.
Você pode baixar o manual completo clicando aqui.
Pesquisadores já utilizam gravadores de som para monitorar o comportamento ingestivo e de pastejo de bovinos, mas não havia um passo a passo de como fazer o procedimento e analisar os áudios. Para isso, foi realizada a avaliação com os gravadores nos animais e as observações visuais, para poder comparar e validar o método da bioacústica. A validação foi realizada em relação ao método de avaliação visual, durante 60 dias, com novilhas Girolando em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), em Porto Velho (RO). “O método é prático e permite o registro de forma precisa e contínua nos períodos diurno e noturno das atividades de pastejo, ruminação, ócio e ingestão de água, o que diminui a possibilidade de subestimação ou superestimação dos resultados”, relata Eduardo Schmitt, professor da Universidade Federal de Pelotas.
Veja o passo-a-passo no vídeo abaixo:
O manual traz dicas importantes e que podem facilitar a utilização da metodologia, minimizando erros e perda de tempo, como o preparo adequado dos gravadores, passo importante para facilitar a leitura posterior dos dados. O manual disponibiliza ainda os espectogramas – representações gráficas das ondas sonoras – para que o usuário possa fazer a interpretação áudios de maneira mais prática e rápida. “Procuramos disponibilizar informações relevantes, aquelas que são o ‘pulo do gato’ para que os usuários não percam tempo e avancem em suas pesquisas”, conta a pesquisadora da Embrapa Rondônia Ana Karina Salman.
Mais autonomia para o monitoramento
A pesquisadora explica que o trabalho de validação mostrou boas vantagens para o método da bioacústica em relação ao visual. Em geral a avaliação visual se restringe ao período diurno e com duração média de 12h, já com o gravador é possível monitorar o animal durante o dia e a noite por 48h ininterruptas. Ela conta que queriam saber, por exemplo, se o animal na pastagem sombreada consumia menos água e pastejava por mais tempo do que na pastagem a pleno sol. Na prática, pelo método visual, não conseguiu diferenciar. No entanto, analisando os áudios foi possível identificar que o número de vezes e o tempo que os animais bebiam água na pastagem a pleno sol foi maior e o tempo de pastejo foi menor do que os animais que estavam em pastagem sombreada.
Considerando as avaliações durante o dia, as informações obtidas sobre os tempos de pastejo, de ócio e de ruminação foram iguais em ambos os métodos. O que demonstra a funcionalidade do uso dos gravadores em substituição ao método visual. “Facilitou o processo, conseguimos ver coisas mais detalhadas e obter mais respostas. É simples o uso, mas precisava de um manual a ser seguido”, argumenta Salman.
Para os produtores, saber detalhes do comportamento animal no pastejo auxilia diretamente no manejo do rebanho. A pesquisadora dá um exemplo: se o profissional informa ao produtor que no início da manhã e final da tarde é o horário de pico de pastejo, o pecuarista não vai prender os animais no curral nesses momentos, buscando a mínima interferência e a máxima eficiência da atividade de pastejo.
Método visual X bioacústica
O método visual é utilizado desde a década de 1980 para a avaliação do comportamento animal. Essa análise implica ficar no campo, olhando os animais e anotando em planilhas o que os bovinos fazem a cada cinco, dez ou 15 minutos, observando com um binóculo, para não interferir no comportamento. “Se eles perceberem que tem alguém os observando, alteram o comportamento. Essa ainda é a forma mais comum de avaliação do comportamento de bovinos e que está registrado como método na maioria dos trabalhos já publicados”, conta Salman.
Trata-se de uma atividade trabalhosa, pois os avaliadores, no mínimo dois, precisam passar o dia inteiro observando, sendo necessárias trocas de turnos. O período da noite é um desafio, pois seria necessária luz artificial para a observação o que interfere no comportamento dos animais ou o uso de câmeras de filmagem noturna, “uma série de limitações que não temos com o uso dos gravadores”, complementa a pesquisadora.
A bioacústica se mostra potencialmente mais eficaz para identificar as alterações comportamentais, sendo possível obter registros contínuos, com o tempo variando de acordo com a capacidade de armazenamento e durabilidade da bateria do gravador. Com isso, eleva-se a precisão das informações por eliminar o intervalo entre observações do método de observação visual, além de eliminar os problemas relacionados ao período noturno.
Método simples e de baixo custo
Para utilizar o método da bioacústica, são necessários gravador MP3, cabrestos, tecido TNT, filme de PVC e fita de empacotamento. O item mais caro dessa lista é o gravador que custa, em média, R$ 250,00 para compra direta, sem frete incluso. A análise dos áudios é realizada com o auxílio do programa Audacity, um software livre (gratuito) que reproduz os áudios captados pelos gravadores. Este programa gera espectogramas dos áudios que são específicos de cada atividade exercida pelos animais, dessa forma é possível identificar os tempos de início e fim de cada uma. De acordo com Eduardo Schmitt, professor da Universidade Federal de Pelotas, “é uma metodologia relativamente barata e fácil de ser utilizada porque não envolve o uso de equipamentos ou programas computacionais caros e de difícil aquisição”.
Vantagens
- Não há a interferência de pessoas durante a coleta de dados;
- Permite a observação do comportamento durante os períodos diurno e noturno;
- Como as informações ficam armazenadas, é possível fazer revisões nas análises de dados, caso ocorra alguma dúvida;
- Como os padrões de sons são bastante distintos e facilmente identificados pelos espectrogramas de programas de áudio, é fácil capacitar pessoas para fazer as análises;
- Em relação ao método de observação visual, não demanda muita mão de obra para a coleta de dados no campo.
Desvantagens
- Do ponto de vista ambiental, existe a produção de resíduo poluente, já que a fonte de energia dos gravadores utilizados são pilhas alcalinas que não podem ser reutilizadas e nem recicladas. O uso de pilhas recarregáveis não é confiável porque não há como medir a perda do seu tempo de vida-útil e isso pode comprometer a coleta de dados;
- Apesar de a análise dos áudios ser uma tarefa de fácil execução, essa etapa da metodologia é laboriosa e é preciso ser feita por pessoas treinadas;
- Não é possível identificar o posicionamento dos animais na pastagem, como por exemplo, se estão deitados ou em pé, ou se estão na sombra ou no sol, etc. Nesse caso, é necessário associar ao uso de outros equipamentos, como câmeras de vídeo e aparelhos para registros de posicionamento global (GPS).
Os pesquisadores consideram que a metodologia da bioacústica apresenta grande potencial para novas pesquisas que possam detalhar ainda mais o comportamento animal, ou oferecer dados que possam determinar o nível de estresse térmico ou o consumo de pasto, entre outros. São informações valiosas para tomadas de decisão dos produtores.
Por: Renata Silva – Embrapa Rondônia