Universidade Federal de Lavras visa atender mercado alimentício interno e externo com agricultura funcional, a instituição aposta em fortificação de nutrientes para criar ‘superalimentos‘.
Superalimentos com mais vitaminas e nutrientes a preços acessíveis e capazes até de combater a subnutrição. É isso que buscam pesquisas da Universidade Federal de Lavras (Ufla) por meio do desenvolvimento da chamada ‘agricultura funcional’.
Em uma estufa, o borrifador aplica nas folhas soluções de selênio, zinco ou iodo. Assim, as plantas de sorgo ganham mais nutrientes e os grãos se tornam alimentos com mais benefícios à saúde, além das funções nutricionais.
“Porque a ideia é produzir algum alimento que tenha um nutriente, uma concentração suficiente para que ele passe a funcionar como se fosse, por exemplo, um remédio. Na verdade, ele é um preventivo de doença”, explica Luiz Roberto Guimarães Guilherme, professor de ciências do solo.
O processo é chamado de biofortificação de alimentos. A cada 100 gramas, os pesquisadores buscam incluir no grão entre 30 a 40% da quantidade diária de determinado nutriente indicada ao ser humano adulto.
“Ele seria bem mais barato do que a suplementação e teria mais acesso para a população, porque a gente faz essa biofortificação em produtos que são consumidos por toda a população, tipo arroz, a mandioca, feijão, que são produtos de fácil acesso”, diz a pesquisadora Ana Paula Corguinha.
No campo, a produtividade aumentaria também. Em pequenas áreas, o agricultor pode ter mais qualidade no grão. Além de atender a uma demanda interna, os alimentos fortificados podem atrair novos mercados consumidores internacionais grandes, como a China e a Índia.
Para garantir o melhor aproveitamento, os pesquisadores estudam a aplicação de nutrientes em várias culturas para tentar entender em quais delas a absorção é maior. Essa é uma forma de ampliar as possibilidades comerciais.
“Alguns países já valorizam mais esses produtos que tenham uma concentração maior de nutrientes”, afirma o pesquisador Gabriel Ferreira de Souza.
“Se nós começarmos a mostrar que o nosso produto está sendo produzido para atender o nosso mercado, para atender uma demanda externa de maneira qualificada, esses mercados vão cada vez mais comprar os nossos produtos”, conclui o professor.
Biofortificação de alimentos é a aposta no combate à fome oculta
Na tentativa de reverter a falta de nutrientes encontrados nos solos agricultáveis no Brasil, pesquisadores apostam na biofortificação agronômica de alimentos – técnica que visa a adicionar, por manejo de adubação, os nutrientes no solo ou diretamente nas folhas das plantas. A finalidade é que eles sejam absorvidos e acumulados nas culturas agrícolas, aumentando o teor desses nutrientes para a alimentação humana e animal. A alternativa busca investir na elaboração de fertilizantes enriquecidos, que estimulam o crescimento das plantas e oferecem maior teor de nutrientes para os alimentos.
Esse tipo de biofortificação consiste nas estratégias de adubação, seja na folha, seja no solo, que possibilitem a acumulação de nutrientes pelas plantas, independentemente se elas passaram ou não por seleção genética. “Se trabalharmos com as duas estratégias de forma conjunta, selecionando plantas que acumulam mais nutrientes e exploramos ao máximo o potencial delas”, explica o pesquisador da Epamig, Fábio Aurélio Dias Martins.
A aplicação pode ser realizada de três formas: apenas nas folhas das plantas, nos solos juntamente com outros fertilizantes ou na combinação de aplicações na folha e no solo em um mesmo plantio.
“A melhor estratégia, normalmente, parte da complementação das três técnicas juntas. Mas, primeiro, é preciso entender cada uma separadamente”, conta Luiz Roberto. O professor do DCS Guilherme Lopes alerta: “entendendo cada técnica de adição separadamente, será possível definir doses adequadas para serem aplicadas, com o intuito de colocar nas partes comestíveis das plantas (por exemplo, nos grãos de arroz e feijão) quantidades dos nutrientes suficientes para atender à demanda nutricional de cada pessoa. Se a deficiência de um nutriente nos alimentos é problema, atingir a toxidez também pode ser. Os níveis de aplicação devem ser exatos”, frisa.
Produtividade
Os pesquisadores são unânimes: além de ser a forma mais barata e eficiente para combater a má nutrição da população e prevenir doenças, a Agricultura Funcional abre um novo nicho de mercado de valor agregado para os produtores brasileiros.
Os mercados chineses e indianos já decretaram: a prioridade é importar alimentos enriquecidos para alimentar os seus mais de 2,7 bilhões de habitantes – 35% da população mundial. Juntos, os dois países compram 50% da produção agrícola do Brasil. “Somos o maior exportador de soja de alto valor de proteína para a China, retirando mercado dos Estados Unidos. Os compradores vão pagar mais caro pela qualidade dos nutrientes. Se não formos rápidos, vamos perder essa onda e arruinar o nosso agronegócio”, aponta o professor Luiz Roberto.
Nem é preciso vender para longe. “O mercado consumidor brasileiro é enorme e carente de alimentos biofortificados. Incentivos criados pela legislação poderiam, por exemplo, valorizar produtos enriquecidos por meio de certificações do arroz de Minas Gerais, que caiu de 10% para 0,5% do total produzido no país”, exemplifica Fábio Aurélio Dias Martins.
No Brasil, o maior caso de sucesso de políticas públicas envolvendo agricultura e saúde é de 1956, quando o médico e então presidente Juscelino Kubitschek decretou a obrigatoriedade de se adicionar iodo no sal para combater distúrbios da tireoide. A legislação brasileira de fertilizantes já recomenda a aplicação de zinco nos solos e, desde 2016, sugere a adição de selênio.
Fome Oculta
A fome oculta é um dos graves problemas mundiais. O número de pessoas adultas desnutridas no mundo é de 500 milhões, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). No total, 44% dos países vivem, ao mesmo tempo, sérios níveis de subnutrição e sobrepeso, incluindo obesidade – ambos são evidências de uma nutrição pobre.
O fenômeno da fome oculta está relacionado a essa dupla carga de desnutrição. Ambos os fatores provocam uma carência de micronutrientes que, a longo prazo, favorece o desenvolvimento de uma série de doenças, como diabetes e câncer. “A biofortificação não quer prover um único alimento capaz de fornecer todos os nutrientes necessários. O ideal é que as pessoas se alimentem com uma dieta equilibrada e com qualidade nutricional. A biofortificação pode contribuir para que o indivíduo faça a ingestão da quantidade diária necessária para cada nutriente, a partir de culturas como a de arroz e a de feijão”, explica.
Outras pesquisas
No Brasil, diversos estados possuem alimentos que já foram testados para a biofortificação: além do arroz, já foram avaliados milho, soja, sorgo, feijão, batata-doce, abóbora e mandioca.
Por: AGRONEWS BRASIL, com informações do G1 e UFLA.