O Resumo de Políticas nº 7, “Melhoria da nutrição através do aprimoramento dos ambientes alimentares”, foi lançado nesta última quarta-feira, 3 de maio, pelo presidente da Embrapa, Maurício Lopes, e Emmy Simmons, ambos membros do Global Panel on Agriculture and Food Systems for Nutrition (Painel Global em Agricultura e Sistemas Alimentares para Nutrição), durante a Oficina sobre Sistemas Alimentares e Qualidade das Dietas, realizada na sede da Embrapa, em Brasília.
A publicação destaca que mais de três bilhões de pessoas em todo o mundo sofrem com os efeitos da má nutrição, o que torna o tema uma prioridade global. Ao mesmo tempo, no modelo atual de produção, os sistemas alimentares não estão conseguindo proporcionar um acesso a dietas seguras e de qualidade para todos. Atraso no crescimento, subnutrição, sobrepeso, obesidade e doenças não transmissíveis por dietas são preocupações de diversos governos.
O Global Panel alerta que o risco que dietas de má qualidade oferecem à mortalidade e à carga de doenças é atualmente maior que os riscos combinados de sexo sem proteção, álcool, drogas e tabagismo. O documento orientador traz recomendações para a elaboração de políticas públicas, como a restrição de marketing de produtos alimentícios para crianças e a redução do consumo de produtos ultraprocessados, assim como a promoção de novos comportamentos alimentares.
É a primeira vez que o Brasil sedia um evento da instituição. Maurício Lopes ressaltou a produção de informações qualificadas, organizadas para facilitar a comunicação com os públicos, como a grande contribuição do Global Panel. Já Emmy Simmons chamou a atenção para o fato de que há 800 milhões de pessoas no mundo morrendo de fome e mais dois bilhões de pessoas com deficiência de macronutrientes, como ferro, zinco e vitamina A. Ela alerta que isso traz consequências sérias para a expectativa de vida da população. “O relatório tira proveito das experiências dos membros do Painel e coloca a dieta no centro das discussões, para elevá-la nas agendas de políticas e do futuro”.
Organizado pela Embrapa, o evento reuniu especialistas para discutir a nutrição no Brasil e as ações de pesquisa agropecuária. A diretora do Global Panel, Sandy Thomas, lembrou o que aconteceu no Brasil: “Em 1990, cerca de 18% da população brasileira tinha problema com desnutrição, agora trata-se de menos de 5%”. No mundo, ela conta, a previsão é de que em 2020 o sobrepeso atinja mais da metade da população. Por isso, a necessidade urgente de abrir debates sobre o tema.
Alan Bojanic, representante da FAO no Brasil, alertou ser fundamental pensar nas politicas do que estão acontecendo no mundo. “Temos 100 milhões de pessoas morrendo de fome em lugares como Etiópia e Somália. É o pior evento de fome desde a Segunda Guerra Mundial. Melhorar a solução nutricional e evitar que pessoas continuem morrendo de fome é crucial, depois de tantos avanços e progressos”. Ele destaca políticas brasileiras que estão sendo analisadas pelo FAO como modelos que podem ser levados para outros países. E cita as de compra de alimentos, transferência de renda, alimentação escolar, compra de produtos da agricultura familiar, atenção à mulher.
A nutrição no Brasil
Graças às políticas públicas brasileiras, cerca de 41 milhões de alunos recebem mais de 130 milhões de refeições por dia. Esse foi o quadro apresentado por Irisléia Aires, do Fundo Nacional de do Desenvolvimento da Educação, sobre a situação da alimentação nas escolas brasileiras. Ela destaca a “preocupação em oferecer um cardápio rico, com acompanhamento de nutricionistas. Há exigência por lei de que pelo menos 30% dos alimentos das escolas sejam comprados da agricultura familiar, que oferece principalmente frutas, hortaliças e leite, como reforço para melhorar a qualidade das refeições”, explicou.
A diretora do Centro de Ciências Exatas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, Neuza Brunoro Costa, apresentou um estudo para acompanhamento da saúde das famílias rurais. Por meio de índices corporais como pressão arterial, exame de sangue e circunferência do abdômen, a pesquisadora identificou que o índice de qualidade da dieta estava abaixo de 51, o mínimo recomendado, resultado de uma dieta inadequada, com baixo consumo de frutas, leite e derivados, combinado com ingestão de grandes quantidades de óleo, sal e açúcar. Havia um excesso de consumo calórico em mais de 70% da população avaliada, com 50% de pessoas com sobrepeso.
O grupo foi acompanhamento pela equipe de pesquisa e, após um trabalho de conscientização e orientação dos agricultores, com incentivo à implantação de hortas, maior consumo de vegetais e redução de gordura, o estado nutricional das pessoas melhorou. “Foi muito gratificante ver como os agricultores foram alterando seus hábitos de consumo. Nesse caso, quando eles entenderam os benefícios proporcionados por esses alimentos, passaram também a aumentar a oferta dos produtos vendidos nas feiras”, concluiu.
“O que deveríamos comer” foi o tema da palestra da professora Silvia Maria Franciscato Cozzolino, da Universidade de São Paulo. Entre as pesquisas com alimentos, ela destacou a que analisa os efeitos dos micronutrientes no organismo, especialmente o selênio presente na castanha do Brasil. Em estudos com idosos com parâmetros bioquímicos alterados no caso de Azheimer, observou-se melhoria nos sintomas após seis meses consumindo apenas uma castanha por dia.
Políticas e ações na pesquisa agropecuária para boa nutrição
Em 2014 o Brasil saiu do Mapa Mundial da Fome, após um trabalho intenso iniciado em 1975, lembrou Michele Lessa de Oliveira, coordenadora-geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde. Ainda assim há um quadro de desnutrição crônica, que pode ser agravado pelo aumento do consumo de alimentos processados e ultraprocessados, doces, bebidas adoçadas e baixa adoção de frutas e verduras nos cardápios das famílias brasileiras. “As frutas não aparecem entre os vinte alimentos mais consumidos pelos nossos adolescentes. Pesquisa feita pelo ministério mostra também que 32% das crianças com menos de dois anos consomem regularmente (cinco ou mais vezes por semana) bebidas adocicadas”, alertou.
Para apoiar o enfrentamento desse cenário que se agrava, Michele cita duas publicações do Ministério da Saúde: Guia Alimentar para a População Brasileira e Alimentos Regionais Brasileiros, que juntos podem orientar a população na construção de dietas mais saudáveis.
Diante de tantos dados e pesquisas apresentados, o presidente da Embrapa explica que a questão da segurança alimentar é urgente, inclusive para países desenvolvidos, já que problemas como déficit nutricional e obesidade estão se tornando muito graves, com consequências sérias para a economia dos países, no que diz respeito ao custo dos sistemas de saúde. “A Embrapa trabalha com a ideia de que vamos ter que migrar de um paradigma da cura, a partir das soluções da medicina, que são caras e complexas, para o paradigma da prevenção, com a agricultura participando ativamente de sua construção”, explica.
“Nós da pesquisa agropecuária temos que começar a colocar a temática no radar dos formuladores de política pública, dos nossos educadores, dos nossos formadores de opinião. Essa é a razão de estarmos trazendo esse evento para o Brasil”, detalhou Maurício Lopes.
Leia mais sobre o tema
Relatório Sistemas alimentares e dietas: Como enfrentar os desafios do século XXI ()
Artigo publicado na revista Nature – Uma nova agenda global para a pesquisa sobre os alimentos
Juliana Miura
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