Plataforma com mais de 108 milhões de dados será ferramenta para adoção de propostas voltadas à produção de leite no Brasil, detalha Paulo Martins.
Uma plataforma com mais de 108 milhões de dados será usada como referência para políticas voltadas à produção de leite no Brasil. O sistema reúne informações de 10 laboratórios creditados pelo Ministério da Agricultura e servirá como ferramenta para monitorar a qualidade do produto no país. Chefe-geral da Embrapa Gado de Leite, Paulo Martins explica que com o cruzamento de informações será possível identificar regiões e municípios que carecem de assistência técnica.
Para ele, a indústria precisa saber o tipo de leite que está comprando, e a população a qualidade do produto consumido. O pesquisador também falou sobre os desafios do setor leiteiro hoje, que vive uma crise do consumo e de preço baixo pago ao produtor. Confira os principais trechos da entrevista, concedida durante o 15º Fórum do Leite, na Expodireto-Cotrijal.
Como funciona o sistema de monitoramento e como os dados serão usados?
O Sistema de Monitoramento de Qualidade do Leite reúne dados dos 10 laboratórios creditados pelo Ministério da Agricultura para monitorar a qualidade do leite no Brasil. Todo produtor e laticínio têm de fazer esta análise, mas esses dados estavam dispersos. A plataforma reúne essas informações e torna possível a utilização por diferentes níveis. Então, temos condições de saber como estão os indicadores de oito itens que compõem a qualidade do leite – por município, por microrregião, por mesorregião ou por Estado. Fazendo comparação entre regiões e entre períodos diferentes.
O sistema foi motivado pela descoberta de fraudes no leite aqui no RS?
Não, era um pedido antigo do setor. Foi pensado durante muito tempo, mas não era implementado. Quando os laboratórios começaram a funcionar, há pelo menos 10 anos, a ideia era reunir as informações, mas isso não acontecia. A Embrapa desenvolveu o sistema no final da gestão de Kátia Abreu (em meados de 2016).
Esse sistema é uma ferramenta no controle da qualidade do leite?
Eu diria que sim, mas não para apurar fraudes. Para verificar a qualidade propriamente dita. É aquela história de pagamento por qualidade. Como tem uma norma de qualidade, o sistema será útil para sabermos em quais regiões do Brasil estamos distantes do padrão ou em que precisamos de um nível de assistência técnica mais focada em reduzir a contagem de células somáticas (CCS) ou contagem total de bactérias (CTB), por exemplo.
A ferramenta é importante para trabalhar em um modelo de pagamento que não priorize só volume, mas qualidade?
Sim. O modelo de pagamento é importante sob a ótica do produtor. Como um todo, é fundamental a melhoria do leite. Pois aumenta a vida útil do produto.
De que forma o cruzamento dessas informações pode ajudar no desenvolvimento de políticas para o leite?
É possível fazer políticas públicas focadas em regiões ou microrregiões, e o Estado pode ser o indutor de melhorias. No setor privado, podem ser adotadas políticas de assistência técnica aproveitando o programa de renúncia fiscal do PIS/Cofins. Podemos ter estratégia de indústria e de produtor de um lado e estratégia de governo de outro, ou seja, estratégias públicas e privadas para melhorarmos a qualidade. As políticas no Brasil precisam ser mais focadas para não jogarmos dinheiro fora.
O que a Embrapa pode fazer para melhorar padrões de qualidade do leite?
A Embrapa vem fazendo a diferença. Se considerar que na década de 1970 era um desafio uma vaca produzir oito litros de leite. Hoje, uma vaca que produz apenas oito litros não é viável economicamente. Isso mostra como foi possível aumentar a produtividade. Conseguimos criar no Brasil raça adequada aos trópicos e fazer adaptação de pastagem. Quando o país estava preocupado com quantidade, já estávamos preocupados em qualidade. Estamos trabalhando com equação genômica, que prevê 78% de probabilidade se um animal será bom produtor de leite ou não.
Qual é o principal desafio do setor?
Um problema grave é a carência em assistência técnica. O papel da Embrapa é gerar conhecimento, mas a inovação é feita no campo. Esse vazio tem sido em parte compensado pelo setor, pelos governos estaduais, que estão em crise – isso dificulta o trabalho – e em parte pelo setor privado e por cooperativas.
Fonte: Gaúcha ZH