A fase em que mais se consome leite durante a vida é a partir do nascimento até a infância. Os adultos desenvolveram o hábito de beber leite há mais de 7.500 anos e, graças a evolução genética, temos a produção da enzima lactase no corpo humano.
A lactase é fundamental na quebra da lactose em glicose e galactose, componente presente no leite dos mamíferos e, consequentemente, da vaca. Como o corpo humano só produz o que será utilizado, a redução do consumo de leite acarreta na diminuição ou até na ausência da produção de lactase. Essa razão juntamente com a questão genética são as principais causas que podem explicar a intolerância a lactose por parte da população.
A questão genética está relacionada à origem dos ancestrais de cada um. Povos oriundos da Escandinávia, por exemplo, tem menos tendência a desenvolver essa intolerância, já que conseguiram domesticar os animais em suas terras e introduzir o hábito de tomar leite na vida adulta para suprir a falta de vitamina D fornecida pelo sol. Já os povos localizados em regiões com maior presença do sol durante o ano, além de alguns sofrerem com o solo pouco favorável à pastagem, tardaram em iniciar essa cultura e por isso, são mais susceptíveis à intolerância a lactose. A menor prevalência de intolerantes à lactose já relatada é de 2% em países como Suécia e Finlândia, enquanto que na América do Sul, África e Ásia gira em torno de 60%, podendo chegar a 100% em alguns países asiáticos.
A alergia à proteína do leite não pode ser confundida com a intolerância a lactose. O primeiro se refere àqueles que possuem alergia às proteínas do leite, devendo tomar somente leites hipoalergênicos. Já o segundo, àqueles que não produzem a enzima lactase no corpo e por isso não conseguem digerir a lactose.
Pessoas alérgicas à proteína do leite, são na verdade, alérgicas à proteína beta-caseína A1 encontrada no leite da vaca. Essa proteína quando quebrada, gera um peptídeo chamado BCM-7 que é um dos principais causadores dos sintomas de alergia no corpo humano. A outra proteína presente, beta-caseína A2, não gera esse peptídeo e pode ser ingerida sem causar qualquer sintoma. Foi a partir dessa informação que em 2003 a empresa neozelandesa The A2 Milk Company foi a pioneira a trabalhar com vacas que possuem uma taxa de produção de proteína A2 naturalmente maior que a média e desenvolveram, então, o leite digerível aos alérgicos à proteína do leite, o leite A2.
Originalmente, as vacas só produziam o leite A2 e, por alguma mutação genética, algumas raças passaram a desenvolver o gene para a produção de leite A1. Entre as raças mais indicadas para a produção de leite A2 estão a raça Jersey e Guernsey, que possui 100% dos seus indivíduos capazes de produzir esse tipo, porém são pouco comuns no Brasil. No entanto, para a produção no Brasil, a raça Gir pura é a mais indicada para a produção desse tipo de leite no país por possuir 96% de proteína A2.
Hoje, a maioria das raças produz ambas as proteínas em expressão e, consequentemente, boa parte das empresas utilizam essas raças por ser mais produtivo o leite com a proteína A1, porém o valor de venda do leite A2 pode ser até quatro vezes maior que o convencional. No Brasil, esse valor agregado ainda não foi bem definido, por ser um mercado novo e ainda em exploração, mas é possível ver grandes diferenças em países como Nova Zelândia, Austrália, Estados Unidos e Reino Unido.
Algumas fazendas no Brasil já estão trabalhando com vacas geneticamente selecionadas para a produção de leite A2. Uma dessas fazendas está localizada em Sapucaia, e é pioneira, no estado do Rio de Janeiro, na produção do leite ideal para aqueles que tem alergia à proteína do leite. A Fazenda Arca de Noé, comandada por Roberto Leite, utiliza ¾ da raça Holandês combinado com a raça Gir e, hoje, possui mais de 50% de todo o rebanho composto por vacas A2A2. Esse mercado pouco explorado de consumidores restritos ao consumo de um tipo de leite específico, foi um dos motivos que levou Roberto a investir nessa produção. Já são 5 anos nesse meio e o próximo passo é começar o beneficiamento para a produção de laticínios.
Com o crescimento desse mercado, há uma consequente movimentação para iniciar o processo de certificação para o leite A2 por parte do Instituto de Zootecnia. O grupo Genesis Group e a revista Leite Integral já fazem esse processo e são uma das portas para aqueles que querem certificar o seu produto.
É importante ratificar que os animais selecionados devem ser comprovados que são A2A2 por meio de testes de genotipagem feitos por laboratórios especializados.
Para a produção do leite sem lactose o processo é diferente. O mercado de produção de produtos sem lactose é o que mais tem crescido no mercado de lacticínios, crescimento de 7,3% comparado a 2,3% do mercado convencional. O produto de maior destaque de crescimento é a produção de leite sem lactose seguido pelo iogurte sem lactose e o queijo sem lactose.
Por um processo industrial, é adicionado ao leite da vaca uma enzima chamada β-galactosidase que, em poucas horas, quebra a lactose. Os monossacarídeos resultantes, glicose e galactose, são adsorvidos no intestino e previnem a ocorrência dos sintomas da intolerância à lactose. O leite tradicional contém aproximadamente 4,7% de lactose e, a partir desse processo industrial, é possível reduzir esse teor a menos de 0,1%. Não há adição de açúcar, mas o leite sem lactose acaba tendo um gosto mais doce porque os receptores reconhecem a glicose e a galactose como mais doce que a lactose.
Portanto, para ser considerado isento de lactose, o produto deve ter abaixo de 100mg de lactose a cada 100ml ou 100g. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) produtos isentos ou com baixo teor de lactose, devem ser rotulados conforme regulamentação específica de alimentos para fins especiais para que assim o consumidor esteja ciente daquilo que está consumindo.
Apesar do leite normal de um litro custar, em média, R$2,35 –2,50 no mercado e o leite de um litro com a lactose hidrolisada custar, em média, R$ 4 a R$ 5 reais, produtos lácteos sem lactose estão se tornando mais populares e oferecem excelentes oportunidades para pessoas intolerantes à lactose para se beneficiar dos diferentes produtos oriundos do leite. Consciência do consumidor sobre a relevância nutricional dos produtos lácteos combinado com o aumento das possibilidades de lacticínios sem lactose e os seus benefícios podem aumentar ainda mais a entrada no mercado desses produtos.
O número de pessoas que necessita desse tipo de leite tem crescido e o mercado tem aumentado a oferta de leite animal isento de lactose para atender essa população. Para os produtores de leite individuais, o ramo livre de lactose parece ser um mercado interessante, lucrativo e em expansão, no qual novos produtos inovadores podem surgir. Para a indústria leiteria como um todo, produtos sem lactose podem atrair diferentes consumidores que não se adaptaram aos produtos lácteos tradicionais e, portanto, esses produtos oferecem a possibilidade de expandir o total mercado. No futuro, são esperados lançamentos de novos produtos nesta expansão rápida segmento da indústria de laticínios.
Referências:
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- Letti A2 é a Primeira Marca Brasileira Certificadora Para Produção de Leite com Vacas A2A2. Grupo mais Food. São Paulo, 2019. http://grupomaisfood.com.br/mais_leite/letti-a2-e-a-primeira-marca-brasileira-certificada-para-producao-de-leite-com-vacas-a2a2/
Por: Thamara Feller Cysne – Animal Business