O sinal verde está sendo dado por empresários mexicanos que assessoram o governo do presidente Enrique Peña Nieto nas negociações com o Brasil
Os brasileiros estão mais perto de conseguir exportar carne bovina e suína in natura para o mercado mexicano. A barreira usada até agora – a alegação de que o Brasil não pode garantir que os rebanhos estejam livres da febre aftosa – pode ser contornada. E, além da carne, há espaço para ampliar exportações de milho, cosméticos, automóveis, entre outros produtos, sem que o importador mexicano pague tarifas alfandegárias.
O sinal verde está sendo dado por empresários mexicanos que assessoram o governo do presidente Enrique Peña Nieto nas negociações com o Brasil. E eles têm pressa. Estão propondo que as conversas sejam encerradas no primeiro trimestre de 2018, antes que as campanhas para eleger novos presidentes nos dois países estejam a todo vapor. O México tem eleições em julho e o Brasil, em outubro. O risco de se politizar acordos comerciais é considerável.
A médio prazo, a maior abertura a produtos brasileiros tem a ver com a constatação de que o México precisa diversificar fornecedores e compradores, reduzindo a dependência dos Estados Unidos. Uma parte dos empresários mexicanos, não a maioria, ainda teme que o acordo de livre comércio com EUA e Canadá, o Nafta, seja destruído pelo presidente Donald Trump. O Nafta deve sobreviver, ainda que modificado, mas as ameaças de Trump estão fazendo com que as empresas mexicanas busquem outras alternativas.
É nesse contexto que Brasil e México podem ampliar o intercâmbio comercial. Neste ano, até outubro, foi de US$ 7,1 bilhões, 18% maior do que o mesmo período do ano passado. “Estamos interessados em abrir nosso mercado ao Brasil”, diz Rafael Nava Uribe, presidente da seção para a América do Sul do Comce, associação mexicana que reúne 2 mil empresas exportadoras e importadoras.
O diretor-geral do Comce, Fernando Ruiz Huarte, também bate na tecla de que é preciso diversificar as relações comerciais. “Não é saudável vender 80% de nossos produtos em um só mercado”, diz ele, referindo-se aos EUA.
O milho é um exemplo da dependência americana. O México compra dos EUA 98% do milho que consome. O vice-ministro de Economia do México, Juan Carlos Baker, disse recentemente ao jornal britânico Financial Times” que estava considerando a possibilidade de abrir o mercado para o milho do Brasil e da Argentina.
A safra de milho nos dois países foi grande neste ano, o que ajudou a elevar a venda aos mexicanos em 11%, até setembro, em relação a 2016. O volume é pequeno em relação ao vendido pelos EUA. Enquanto os americanos exportaram 10,5 milhões de toneladas aos mexicanos em setembro, o Brasil vendeu 100,8 mil toneladas.
“Os empresários mexicanos estão abrindo os olhos para o Brasil e o Brasil está em um momento favorável”, diz João Marcelo Galvão de Queiroz, ministro-chefe da Embaixada do Brasil no México, referindo-se à safra de grãos deste ano. O diplomata lamenta que o Brasil ainda não esteja exportando carne in natura, uma demanda brasileira que já dura cerca de dez anos.
Nava, do Comce, vê dois caminhos para a carne brasileira no México. Um seria replicar o modelo aplicado à carne uruguaia. “O Uruguai não está totalmente livre de aftosa, mas compramos deles. O que fazemos é ter fiscais nossos lá, que liberam a carne”. Segundo ele, isso encarece a carne, mas é um jeito de entrar no mercado mexicano, dominado pela carne dos EUA.
A outra alternativa é usar o instrumento de “reconhecimento mútuo”, ou seja, o Brasil aceitaria a carne mexicana e vice-versa. “Mesmo que o México não exporte carne ao Brasil, e não deverá exportar, seria uma forma de comprarmos carne do Brasil”, diz Nava.
O Brasil já é um grande exportador de carne de frango, in natura congelada, ao mercado mexicano. Mas a exportação está limitada a uma cota, sob pressão dos produtores locais. “O Brasil ocupa quase 100% da cota. É um mercado novo, que não existia há quatro anos”, diz Queiroz. Essa cota, também aberta a outros países, expira neste mês e não se sabe o que o governo mexicano vai fazer.
Brasil e México podem, desde 2002, intercambiar, sem pagar tarifas de importação, 800 produtos. Em 2015, os dois países decidiram ampliar este acordo e mais 1.200 produtos foram incluídos na lista negociada. Dentre eles, produtos químicos para fazer garrafas PET e cosméticos, setor onde a brasileira Natura já tem uma operação estabelecida há mais de dez anos no México, com uma força de vendas de 200 mil pessoas.
Os dois países estão negociando a inclusão de mais 2 mil produtos. Carne e grãos estão nesse grupo, considerado mais sensível. “Acredito que cheguemos a um total de 5 mil produtos na lista nova”, diz Nava. Açúcar e café, segundo ele, não devem entrar de jeito nenhum. O México exporta essas duas commodities e pretende proteger a produção local.
O acordo automotivo, que permite exportar e importar carros e autopeças, pagando tarifa zero desde 2002, também está sobre as mesas do Itamaraty e da Secretaria de Economia do México. Em sua versão original, não havia cotas, o comércio estava liberado. Mas, em 2015, o Brasil pediu cotas e reclamou que carros usados importados pelos mexicanos dos EUA estavam tirando mercado dos carros populares brasileiros.
O México, então, começou a exigir que os carros usados vindos do outro lado da fronteira teriam que ter determinado limites de emissão de CO². Com isso, a importação caiu de cerca de 1 milhão de carros, em 2014, para 50 mil, um ano depois. O sistema de cotas tem prazo para terminar: março de 2018.
“Como o governo brasileiro não pediu até agora para manter as cotas, acredito que o comércio será liberado novamente”, diz Nava, lembrando que se trata de um intercâmbio administrado, já que as montadoras instaladas no Brasil também operam no México.
Fonte: Valor Econômico