Estudo da Conab indica troca do grão pela soja na primeira safra; estoque global e preços baixos devem pressionar próximo ciclo
O agro seguirá como um dos motores da economia brasileira e deverá recuperar a participação no Produto Interno Bruto (PIB) em 2017, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para a companhia, no entanto, alguns produtos terão que equilibrar a relação entre oferta e demanda para garantirem a rentabilidade aos produtores. O produto que mais preocupa é o milho, com um safra atual recorde e com um estoque que chega ao triplo do registrado no ciclo 2015/2016.
“Se houver uma safra como foi a atual, recorde, isso traz uma pressão muito forte no mercado, dadas as condições que a gente observa hoje de preços em queda”, diz o superintendente de Gestão da Oferta da companhia, Wellington Silva Teixeira. “Saimos de um estoque de 7 milhões de toneladas para 20 milhões de toneladas de uma safra para outra. Isso traz preocupação e a necessidade de que o produtor observe isso e possa calcular melhor o que vai plantar”.
A análise está no estudo Perspectivas para a Agropecuária, Safra 2017/2018 apresentado nesta quarta-feira, 6, pela Conab. De acordo com a pesquisa, os preços domésticos do milho encontram-se abaixo do mínimo, sobretudo no Mato Grosso, estado com maior sensibilidade ao custo logístico. Em Sorriso, MT, as cotações do grão em julho fecharam a média mensal em R$ 12 por 60 Kg e com tendência de baixas ainda maiores, com o decorrer da colheita da segunda safra. O preço mínimo no Estado é R$ 16,50.
“Além da safra robusta de milho, a paridade de exportação mais baixa nos portos brasileiros devido não só aos preços em Chicago, mas à desvalorização do dólar frente ao real, bem como o alto custo de frete, ajudam a pressionar as cotações internas, causando apreensão nos produtores que não enxergam no curto prazo sinal de melhora”, diz a pesquisa.
A Conab aconselha o produtor a diminuir a área plantada ainda mais do que a projeção de 2% a 5% para que seja atingida uma produção inferior a pelo menos 90 milhões de toneladas. A expectativa é de diminuição de área na primeira safra em detrimento da soja, já que a rentabilidade da oleaginosa está mais atrativa – considerando os Estados em que são concorrentes. “Para a maioria das praças o milho está pagando somente o custeio da lavoura, enquanto a soja garante uma boa rentabilidade para todos os custos, inclusive o operacional, mesmo com os preços menores que os registrados no ano passado”, informa o relatório.
Esse cenário deve ter maior pressão sobre o milho primeira safra do que em relação ao safrinha, quando muitos produtores não possuem alternativas com a mesma liquidez e mercado do que o grão para fazer a mudança. “Caso não haja uma redução mais significativa da produção brasileira do grão, provocando uma diminuição significativa nos estoques finais, visto que o consumo doméstico e as exportações têm seus limites de incremento, os preços devem continuar sob forte pressão baixista ao longo do ano safra 2017/2018”, alerta o documento.
Em 2016/2017, houve aumento da área de primeira safra, além das condições climáticas excelentes que permitiram ao Brasil atingir um volume de 97,2 milhões de toneladas, segundo a companhia.
Soja – A soja, que tem um peso grande nas exportações brasileiras – representando 13,72% de toda a exportação brasileira em 2016, ou seja, US$ 25,42 bilhões – continuará sendo o produto de maior rentabilidade ao produtor e liquidez de mercado, segundo a Conab. Apesar de um cenário que o produto não está em seu auge, registrando em 2016 o segundo ano consecutivo de queda nos valores das exportações, puxadas, principalmente, pela baixa dos preços deste complexo no mercado internacional, a companhia está otimista.
“A soja tem uma liquidez muito grande. Para se ter ideia, os estoques de passagem de um ano para o outro são muito pequenos, não representam nem 5% da safra. É um produto que vende muito rápido, ninguém segura estoque da soja, mesmo com cenário de oferta internacional grande, preços pressionados, esses preços ainda estão em patamares remuneradores. Os produtores falam que está ruim porque já esteve R$ 80 [a saca], agora está R$ 56, mas é bom preço”, diz Teixeira.
Segundo o estudo, as exportações da soja para 2017 estão estimadas em 63 milhões de toneladas, valor 22% maior que o total exportado em 2016, podendo ser ainda maior caso venha a ocorrer problemas climáticos nos Estados Unidos, possibilitando que o Brasil continue com as altas exportações após a colheita americana, ou seja, nos meses de setembro a dezembro de 2017, antes do fim do ano safra nacional.
A poucos dias do início do plantio da safra 2017/2018 no país, a expectativa é que a produção de soja atinja 107 milhões de toneladas, ante as 113,93 milhões de toneladas estimadas pela companhia em 2016/2017. Na ponta da demanda, as vendas externas do Brasil tendem a crescer 1,5%, para 64 milhões de toneladas.
Para os subprodutos do complexo soja, a estimativa é de estabilidade até 2018, visto que a demanda por óleo e biodiesel não deve aumentar, assim como o uso de farelo para consumo animal e industrial. Por este motivo, os esmagamentos projetados para a safra 2017/2018 são de aproximadamente 43 milhões de t e com um consumo interno total girando em torno de 47 milhões de t. Neste contexto, os estoques de passagem ficariam em, aproximadamente, 1,72 milhão de t.
Algodão – A previsão da Conab é de aumento de 7,19% na produção mundial, com volume chegando a 24,59 milhões de toneladas. Esse crescimento deve ser acompanhado por alta de 2,06% no consumo, que ficará pouco abaixo do total produzido, reduzindo os estoques mundiais. Com a procura maior do que a oferta, os preços do produto brasileiro devem continuar firmes.
Segundo a companhia, atualmente, o algodão que está sendo colhido é vendido em média a R$ 78,00 por arroba, e os contratos para 2017/2018 estão sendo negociados por valor semelhante. Mantidas a normalidade climática e os preços remuneradores, a expectativa da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) é de que haja crescimento de dois dígitos na quantidade a ser produzida na safra 2017/2018 brasileira.
Lácteos – O nível da produção total de leite em 2017 deve situar-se em 34,9 bilhões de litros (1,0%) e irá depender do cenário interno, onde vários fatores podem influenciar na evolução da atividade nos próximos meses. No primeiro trimestre de 2017, a produção sob inspeção apresentou leve aumento de 0,1% na comparação com o mesmo trimestre do ano anterior, situando-se em 5,8 bilhões de litros. A redução da oferta da produção sob inspeção por dois anos consecutivos, em 2015, de 2,8%, e em 2016, de 3,7%, deve oferecer certo suporte aos preços pagos ao produtor em 2017, incentivando o aumento da produção, mesmo com os produtores enfrentando alta das importações. Os preços pagos ao produtor nesse primeiro semestre de 2017 evoluíram 1,3% ao mês, diz a Conab.
Relatório da FAO ainda aponta que entre 2017 e 2026, a produção de queijo deve aumentar 20,5% (2,1% aa), alcançando 915,83 mil t no final do período; a de leite em pó integral, 49,1% (4,5% aa), alcançando 788,69 mil t em 2026; a de leite em pó desnatado, 16,7% (1,7% aa), alcançando 183,33 mil t em 2026; e a de manteiga deverá aumentar 14,7% (1,5% aa), alcançando 97,08 mil t em 2026.
Carnes – Teixeira também destaca a recuperação da pecuária, após os impactos da Operação Carne Fraca, deflagrada em março deste ano pela Polícia Federal, com foco na falta de qualidade do produto em determinados frigoríficos brasileiros. “O governo brasileiro, por meio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento fez um trabalho muito forte de convencimento junto a esses mercados para mostrar a qualidade da carne brasileira. Foram problemas pontuais, o governo mostrou que não reflete a realidade da produção brasileira”, diz o superintendente.
De acordo com o relatório, as estimativas atuais indicam uma redução de aproximadamente 2% nos volumes a serem exportados esse ano, porém com uma receita de cerca de US$ 8,9 bilhões, ou seja, aproximadamente 9% acima daquela verificada em 2016, devido a uma melhora nos preços internacionais em dólar por tonelada, com destaque para a carne suína, o que favorece a receita com as exportações.
Feijão – O milho também pode perder espaço para o feijão. A primeira safra de feijão da temporada 2017/2018 deve registrar aumento na área plantada em virtude dos bons preços recebidos pelos produtores e o mercado desfavorável para a cultura do milho, sobretudo no Paraná, estima Teixeira.
Os altos preços de comercialização do feijão em 2016 e os valores ainda remuneradores vistos no primeiro semestre deste ano são os principais pontos de estímulo ao plantio da próxima temporada. “No ciclo passado houve uma quebra muito forte que acarretou uma recuperação no plantio das três safras de 2017”, lembra o executivo.
Com o consumo ajustado à oferta, os preços da saca vigoram entre R$ 100 e R$ 150, considerados atrativos, e a expectativa de produtividade está acima dos 3,5 mil quilos por hectare. Em 2016/2017, o rendimento do grão era de 1,06 mil quilos por hectare e na safra de 2015/2016 este número equivalia a 886 quilos por hectare.
Crédito rural – Chama atenção da Conab a nova composição do crédito rural para o produtor. “Os bancos públicos e agências de fomento, apesar de oferecerem maior volume de recursos financeiros, seguem reduzindo sua participação no segmento de crédito ao agricultor enquanto bancos privados e cooperativas de crédito ampliam sua oferta relativa”. De acordo com o Banco Central do Brasil (Bacen), o valor contratado acumulado de 12 meses até junho reduziu 17,4% para os bancos públicos, aumentou 16,7% para os bancos privados e cresceu 21,3% para as cooperativas de crédito. “Ou seja, houve uma evidente realocação do setor”.
Fonte: Portal DBO