Produtores da região de Itapetininga, no interior de São Paulo, conquistaram a certificação para produzir o leite de búfala orgânico, o que poderá aumentar em até 50% o preço pago pelo litro de leite, além de ampliar a oferta de produtos ao consumidor paulista.
O trabalho de orientação para converter a produção do leite convencional para orgânica é realizado desde março de 2018 por técnicos da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado, por meio da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) Regional Itapetininga.
“Essa certificação é a segunda do Estado e a terceira do Brasil. As outras propriedades certificadas ficam em Joanópolis, em São Paulo, e Valença, no Rio de Janeiro”, informa a zootecnista Ana Paula Roque, que atua na CDRS Regional Itapetininga e foi a responsável pelo acompanhamento técnico das propriedades e do processo.
As duas propriedades certificadas estão localizadas no município de Sarapuí: o Sítio São José, do produtor Adriano José Nunes de Almeida, e o Sítio Nossa Senhora Aparecida, de Antônio Bento da Silva. “Cada uma possui cerca de 60 hectares e em torno de 90 búfalas em lactação. Durante a conversão, o laticínio já se propôs a pagar 30% a mais pelo leite. Com a certificação, esse bônus passa para 50%”, explica Ana Paula.
Acompanhamento
De acordo com a zootecnista, as propriedades certificadas passaram por um rigoroso processo de acompanhamento técnico, documental e de inspeção. O diretor da CDRS Regional Itapetininga, Luiz Carlos de Carvalho Leitão, frisa que as propriedades certificadas são vinculadas à Cooperativa dos Produtores de Leite e Demais Produtos da Agricultura Familiar de Sarapuí e Região (Colaf), entidade apoiada pelo Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável – Microbacias II – Acesso ao Mercado, executado pela pasta, por meio da CDRS, com recursos de mais de R$ 980 mil, com contrapartida de 30% pelos produtores.
“Esses recursos, sobre os quais os produtores afirmam que sozinhos não teriam condições de investir, foram utilizados na implantação de um entreposto de leite de búfala em terreno cedido pela prefeitura municipal, no qual estão sendo feitas as adequações finais propostas pelo Ministério da Agricultura para obtenção do selo do Sistema de Inspeção Federal”, afirma.
Outro apoio importante para os produtores foi a orientação técnica para melhoria da qualidade do leite de búfala, um dos quesitos fundamentais para obtenção da certificação.
“O atendimento técnico aos cooperados é realizado pela Casa da Agricultura municipalizada, juntamente com o corpo técnico da Regional de Itapetininga. Uma das ações é a análise mensal da qualidade do leite, em um projeto realizado em parceria com o Instituto de Zootecnia. Essas avaliações contribuíram para a melhoria da qualidade do leite produzido de forma convencional e também do leite orgânico, sendo balizadoras das orientações nas atividades de ordenha e higienização das instalações”, completa.
Extensão rural
A zootecnista Ana Paula conta que tudo começou em outubro de 2017, quando um laticínio de Valença propôs a produtores da região pagar a mais pelo leite orgânico e apoiar o processo de conversão.
Em abril de 2018, foi realizada uma capacitação aos produtores, para produção de leite orgânico, em uma parceria entre as Regionais da CDRS de Avaré e Itapetininga e a Diretoria de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente de Sarapuí, tendo como instrutor o engenheiro agrônomo de Avaré Sérgio Augusto Martins Faria.
Segundo ela, 15 produtores participaram de uma primeira reunião, após a citada capacitação. Desses, cinco se interessaram em iniciar o processo. “O laticínio se comprometeu a pagar o consultor para planejar o manejo e a visita da certificadora no primeiro ano”, lembra. Ao longo da transição, Ana Paula foi chamada para acompanhar.
Em dezembro de 2018, ela levou os produtores à fazenda Recanto SS, do produtor Claudine Saldanha Júnior, em Itirapina, para conhecer o processo na prática.
Futuro promissor
Em 2018, produtores da Cooperativa dos Produtores de Leite e Demais Produtos da Agricultura Familiar do Município de Sarapuí e Região (Colaf) receberam a proposta do laticínio Vitalatte, do Rio de Janeiro, para o qual já forneciam o leite convencional, de fornecer também o leite orgânico.
A remuneração pelo produto foi um grande atrativo aos produtores da região. Pelo leite entregue durante o período de conversão, eles recebem 30% a mais, em relação ao preço base, que é de R$ 2,20. Quando o leite finalmente estiver certificado, os produtores deverão receber 50% a mais em relação ao preço base.
Um dos produtores que aceitou realizar a conversão para produtos orgânicos foi justamente Adriano José Nunes de Almeida, de Sarapuí. Com a ajuda da esposa, Márcia, e do filho, ele chega a produzir cerca de 100 mil litros de leite de búfala ao ano. A meta agora é ampliar o faturamento com a inclusão de animais no rebanho.
Adriano José Nunes de Almeida conta que o processo de conversão foi longo, mas teve o importante apoio dos técnicos da CDRS. “Recebemos toda a orientação, desde o processo da documentação até a adequação dos implementos para tornar a produção orgânica”, diz o produtor, que também cultiva tangerinas. “Durante o processo de certificação, já estamos recebendo a mais pelo litro do leite e a empresa arca com os custos da certificadora no primeiro ano”, afirma.
De acordo com Ana Paula, os produtores tinham muita dificuldade em aplicar o Plano de Manejo Orgânico. “Foi aí que começou o trabalho da Secretaria de Agricultura”, lembra a técnica, que também buscou aperfeiçoar conhecimentos tanto para o desenvolvimento do trabalho técnico como documental exigido pela certificadora.
“Aprendi sobre os aspectos conceituais da pecuária leiteira orgânica, tecnologias a serem utilizadas, homeopatia, tudo acompanhado de visitas práticas em propriedades orgânicas da região de São Carlos. A troca de experiências entre técnicos e produtores participantes do curso foi muito enriquecedora”, relata.
Desafio
O maior desafio dos produtores da região de Itapetininga foi a gestão de informações como a identificação dos animais, implantação de planilhas de produção vegetal e animal e outros controles de campo, que não eram realizados nas propriedades participantes. “Outro fator é a compra de grãos orgânicos, principalmente o milho, que não são produzidos na região de Itapetininga e têm que ser comprados em outros estados, o que encarece o produto”, disse Ana Paula.
O assessor do Gabinete da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, Edwin Montenegro, destaca que a pasta tem desenvolvido estudos e diagnósticos em diversos segmentos produtivos, que sinalizam que a estratégia do desenvolvimento dos orgânicos está na cadeia de insumos.
“Temos como prioridade aumentar essa produção de grãos orgânicos, pois esses insumos não estão sendo supridos pela produção paulista. Dessa forma, conseguiremos abastecer não só os produtores de leite, como também de ovos e frangos orgânicos”, afirma.
Graças à boa alimentação dos animais, a produção de leite orgânico pelos criadores da região de Itapetininga foi semelhante à produção convencional, com pastejo rotacionado, balanceamento de dietas e bem-estar animal. Um dos pontos positivos, destaca Ana Paula, foi que os bubalinos raramente enfrentam problemas com mastites e carrapatos, o que facilitou o processo de conversão, no que se refere às questões sanitárias. “O controle de endo e ectoparasitas está sendo feito com produtos homeopáticos”, explica.
Sobre o leite de búfala
O leite de búfala é naturalmente A2, pois não contém a beta-caseína A1, uma substância associada a reações alérgicas, inflamações e desconforto gastrointestinal por uma parte da população. Por ter elevado teor de sólidos, é utilizado na produção da muçarela e em seus diversos formatos, como burrata, frescal, ricota, requeijão cremoso. É cada vez mais apreciado pelos consumidores por sua textura delicada e sabor suave.
“O leite de búfala tem alto rendimento na fabricação de queijos, em relação ao leite de vaca. Com teores de gordura que podem chegar a 6,5% e de proteína entre 4,5% a 5%, são necessários apenas cinco a seis litros de leite de búfala para fazer um quilo de muçarela, contra 10 litros do leite de vaca”, explica Ana Paula Roque, que na regional de Itapetininga da CDRS é responsável pelo atendimento aos criadores dos bubalinos.
Produto diferenciado
A muçarela de búfala é obtida a partir do leite extraído do animal. Após sofrer o processo de pasteurização, o soro é retirado e a massa ganha o formato comercializado no mercado. Tal muçarela não é prensada. Trata-se de um produto considerado nobre, uma vez que a produção de leite de vaca é maior do que a de búfala e, consequentemente, a de queijo também. Mas os benefícios encontrados na muçarela de búfala são bem maiores quando comparados aos da muçarela de vaca.
A versatilidade do item é bastante apreciada na culinária. Por ter um sabor delicado e suave, é muito utilizada no preparo de doces e salgados, compondo pratos como saladas, recheios de massas e tortas. O produto constitui a base de pratos como bruschettas, risotos e salada caprese, entre outros.
De acordo com o Centro de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Cesans), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a muçarela de búfala tem 59% a mais de cálcio e 40% menos colesterol. Com relação ao sódio, 100g de muçarela de vaca contêm 581mg, enquanto na muçarela de búfala há 415mg.