Quatro plantas paranaenses são habilitadas e representantes comemoram chance de direcionar produção excedente ao exterior ainda que com baixa competitividade.
A China habilitou 24 plantas brasileiras para exportação de derivados de leite, quatro das quais são paranaenses, mas os representantes do segmento estão cautelosos com a notícia. Há falta de competitividade nacional em relação às principais nações fornecedoras de lácteos. Por outro lado, diretores de cooperativas do Estado enxergam no aumento da demanda mundial a possibilidade de elevar as margens de lucro, ter capacidade de investimento e, em um segundo momento, entrar na disputa.
As 800 mil toneladas (t) de lácteos importadas pela China no ano passado representam um terço a mais do que as 600 mil produzidas pelo Brasil no mesmo período, segundo o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). No entanto, Nova Zelândia e Austrália conseguem exportar derivados de leite por um preço bem abaixo do brasileiro, que é maior até que o valor uruguaio e argentino.
Para o Brasil, a possibilidade de exportar aparece mais como uma chance de escoar o excedente de produção, que hoje acaba por comprimir as margens de lucro ou, muitas vezes, colocar o preço de revenda abaixo do custo de produção. “A possibilidade de exportação tende a trazer estabilidade para a indústria, que poderá direcionar a produção para fora e pensar em elevar a produção”, diz o zootecnista Guilherme Souza Dias, do DTE (Departamento Técnico e Econômico) da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná).
Das quatro plantas paranaenses habilitadas, três são de Marechal Cândido Rondon, no Oeste do Estado. São as fábricas da Alibra Ingredientes, para leite em pó, soro de leite em pó e outros; da Sooro Concentrado Indústria de Produtos Lácteos, para soro de leite em pó e whey protein; e a Frimesa Cooperativa Central, para leite condensado e queijo. De Rio Azul, no Sudeste, a Schreiber Foods do Brasil pode exportar queijos e outros.
Há ainda outras fábricas com pedidos abertos ou em vias de conseguir a habilitação, caso da londrinense Cativa Cooperativa Agroindustrial. Todos os documentos já foram enviados, traduzidos e a diretoria da empresa espera a liberação até o fim de agosto para as plantas de Londrina e de Pato Branco, para exportação de leite em pó.
O presidente da Frimesa, Elias José Zydek, afirma que a abertura chinesa para o leite brasileiro destrava o mercado, mas que é difícil competir com o produto da Oceania. “O custo de produção na Nova Zelândia e na Austrália é de US$ 0,28 a 0,30 por litro, enquanto no Brasil está em US$ 0,38 a 0,40. Isso se deve ao nosso Custo Brasil, que são impostos, problemas logísticos, tudo o que encarece a nossa produção.”
O desafio, diz Zydek, é elevar a produtividade, a escala e a qualidade do leite brasileiro. “A maior demanda deve motivar os investimentos, porque os lácteos são subvalorizados no Brasil. Não faz sentido um litro de leite longa vida a R$ 2,50 no supermercado”, diz o presidente da Frimesa.
Com 30 países como destinos de exportações, a expectativa na Cativa é ganhar um pedaço do mercado chinês. “Vamos precisar aguardar a movimentação de mercado, porque leite em pó é uma commodity e a Nova Zelândia atende boa parte do mercado chinês, até pela proximidade e o frete mais em conta”, diz o gerente comercial corporativo da Cativa, Robson Ortega.
Apesar de querer “portas abertas”, Ortega não espera resultados em curto prazo. “Mas sempre gera uma expectativa, porque se temos excedente no mercado interno, os preços caem muito. Se pudermos escoar, isso mantém uma média por aqui.”
Um desafio é aumentar a qualidade do produto brasileiro, de acordo com a demanda internacional. “Avançamos muito, mas precisamos melhorar mais em termos de contagem bacteriana, sanidade, teor de sólidos, porque o leite que é exportado é em pó, creme de leite, queijo, sempre com valor agregado”, diz o zootecnista da Faep.
Mesmo assim, Zydek destaca que qualquer abertura precisa ser encarada como positiva. “De imediato, isso não gera um grande resultado, mas abre portas. O nosso preço pode não ser bom hoje, mas amanhã isso pode mudar.”
Qualidade e marca de sucesso
Será preciso adequar o produto e até o marketing dos lácteos brasileiros para cair no gosto dos chineses, dizem representantes do setor no Paraná. “Só o acesso ao mercado não garante a venda. Na China, eles gostam de qualidade, de marcas de sucesso nos países de origem e de inovação. Existe um iogurte que não precisa de refrigeração que virou febre por lá”, diz o zootecnista Guilherme Souza Dias, da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná).
O gerente comercial corporativo da Cativa, Robson Ortega, também cita o queijo brasileiro como um produto com maior facilidade de exportação ao gigante asiático. “Não é muçarela, mas queijos especiais, com maior valor agregado”, diz.
Já a Frimesa também está habilitada para vender leite condensado e queijo para lá. “Temos de evoluir em qualidade e em elaboração de tipos de queijos”, diz o presidente da Frimesa, Elias Zydek.
Importância regional
Com a abertura do mercado chinês, a Viva Lácteos (Associação Brasileira de Laticínios) estima exportar US$ 4,5 milhões em produtos. Os chineses importaram 108 mil toneladas em queijos no ano passado, com alta média anual de 13% nos últimos cinco anos. O setor brasileiro exportou para mais de 50 destinos em 2018, segundo informações do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).
Os três estados do Sul do País produzem hoje 38% do leite brasileiro, segundo a Faep. A expectativa é que a região, que tem os produtores mais profissionalizados, chegue à metade do total nos próximos anos. (F.G.).
Fonte: Folha de Londrina