A Youtuber Indígena, Ysani Kalapalo, tem mais de 270 mil inscritos em seu canal no YouTube, e diz que quando defendia a esquerda, repetia coisas ‘como um papagaio’.
A presença de Kalapalo na comitiva presidencial que foi a ONU, causou descontentamento entre organizações indígenas. Entenda o caso.
Nesta terça-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro (PSL) fez um discurso na cerimônia de abertura da 74ª Assembleia-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Nova York, e mais uma vez defendeu a atuação de seu governo no combate às queimadas na Amazônia. Na comitiva, estava a Youtuber indígena Ysani Kalapalo, que o presidente levou até o evento para endossar seu discurso.
O presidente Jair Bolsonaro abriu seu discurso com a apresentação de um novo Brasil, que “ressurge depois de estar a beira do socialismo“, ele continua: “Um Brasil que está sendo reconstruído a partir dos anseios e dos ideais de seu povo. No meu governo, o Brasil vem trabalhando para reconquistar a confiança do mundo, diminuindo o desemprego, a violência e o risco para os negócios, por meio da desburocratização, da desregulamentação e, em especial, pelo exemplo.
Meu país esteve muito próximo do socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção generalizada, grave recessão econômica, altas taxas de criminalidade e de ataques ininterruptos aos valores familiares e religiosos que formam nossas tradições.“, estas foram as considerações iniciais do presidente na abertura da Assembleia Geral da ONU. Jair Bolsonaro faz um pronunciamento destinado aos povos indígenas citando “Senhorita YSANY KALAPALO, agora vamos falar de Amazônia” e afirma “O Brasil agora tem um presidente que se preocupa com aqueles que lá estavam antes da chegada dos portugueses. O índio não quer ser latifundiário pobre em cima de terras ricas. Especialmente das terras mais ricas do mundo. É o caso das reservas Ianomâmi e Raposa Serra do Sol. Nessas reservas, existe grande abundância de ouro, diamante, urânio, nióbio e terras raras, entre outros”.
Mas afinal, quem é Kalapalo?
Nascida na aldeia Tehuhungu, no parque do Xingu, Ysani Kalapalo atua na militância indígena há 11 anos. Seu canal, que já tem mais de 270 mil inscritos, é alimentado com vídeos dela em posição de selfie falando sobre os mais variados temas.
Em vídeo postado com legendas em inglês na página do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, dois dias antes do discurso de Bolsonaro na ONU, ela repete a posição adotada pelo governo sobre as queimadas na Amazônia:
“Existe muito fake news dizendo sobre as queimadas. Estão dizendo que é culpa do governo Bolsonaro, que ele entrou e está queimando todo o Xingu. Não existe isso daí. A nossa cultura é fazer roça pra plantar mandioca e pra plantar outras coisas. Isso faz parte da nossa cultura, não é porque entrou um novo governo e ele tá queimando tudo. Nessa época de ano, essa época quente, sempre houve queimadas pra queimar roça. Isso faz parte, é normal. Isso é tudo exagero que a mídia está fazendo, não é culpa do governo.“
Repúdio da aldeia
Após Bolsonaro anunciar que ela participaria da Assembleia-Geral da ONU com ele, 16 líderes dos povos do Xingu, inclusive o cacique da etnia de Ysani, os Kalapalo, redigiram uma carta de repúdio à presença de Ysani na comitiva presidencial.
“O governo brasileiro, não se contentando com os ataques aos povos indígenas do Brasil, agora quer legitimar sua política anti-indígena usando uma figura indígena simpatizante de suas ideologias radicais com a intenção de convencer a comunidade internacional de sua política colonialista e etnocida“.
O Instituto Raoni, do cacique Raoni Kaiapó, também divulgou um texto negando que Ysani os representa:
“Ao contrário do homem branco que (na maioria das vezes) elege um político sem preparo como liderança, os indígenas recebem orientações e treinamentos desde muito cedo até o momento de se tornarem líderes e assim representar seu povo.“
Recentemente indicado ao Nobel da Paz e citado no discurso de Bolsonaro como “massa de manobra”, Raoni costumava ser uma das lideranças mais elogiadas por Ysani. Hoje, é alvo das críticas da youtuber.
Desde a campanha eleitoral, Bolsonaro afirma que não pretende demarcar “nenhum centímetro a mais de terra indígena”, posição que reiterou no púlpito da ONU. Também tem indicado a pretensão de flexibilizar as leis sobre o uso dessas terras, permitindo por exemplo a prática da mineração.
Apoio oficial
O Grupo de Indígenas Agricultores foi a única organização indígena a apoiar explicitamente a ida de Ysani à ONU:
“O ambientalismo radical e o indigenismo ultrapassado e fora de sintonia com o que querem os povos indígenas representam o atraso, a marginalização e a completa ausência de cidadania”, afirmaram em carta.
O antropólogo Estevão Fernandes, da Universidade Federal de Rondônia, explica que existe um choque geracional entre as lideranças indígenas e Ysani. O conflito se agrava porque jovens indígenas, que saem das aldeias para fazerem ensino médio e superior, acabam virando “embaixadores” da cultura.
Para Estevão, eles “não querem apenas ser vistos como ‘embaixadores’, mas sim como líderes, pois entendem ter a articulação e o conhecimento necessários para buscarem, eles mesmos, os benefícios para suas comunidades”.
O modo como agem desagrada os mais velhos. O antropólogo recorre às palavras do cacique Ailton Krenak para dizer que, para os indígenas, a questão não é ser de esquerda ou direita:
“No ano passado, Krenak disse que não se preocupava com a mudança de governo, que eles resistem há 500 anos e vão seguir resistindo — que a ele preocupava se os brancos, sim, resistiriam.”
*Com informações do Yahoo