Há exatamente um ano, em meio à Conferência do Clima da ONU, em Paris, dois Estados brasileiros se anteciparam às ações do governo federal e fizeram anúncios que foram elogiados pelo grau de ambição. Mato Grosso e Acre assinaram um compromisso de zerar o desmatamento ilegal da Amazônia até 2020 – a meta nacional é até 2030. Um ano depois, porém, a situação de perda florestal em nada se parece com um plano para alcançar essas metas.
Seguindo a tendência da maioria do bioma, o Acre teve um aumento de 47% no desmatamento entre agosto de 2015 e julho deste ano, na comparação com o período anterior. Para toda a Amazônia, o crescimento do desmate foi de 29%. Já o Mato Grosso apresentou uma redução de 6%, mas se manteve na vice-liderança em área perdida.
Em números absolutos, o Acre teve 389 km² de corte raso neste ano, contra 264 km² no ano anterior, e o MT perdeu 1.508 km², contra 1.601 km², de acordo com a estimativa do Prodes, sistema de monitoramento por satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgada na semana passada.
O Mato Grosso particularmente chama mais atenção pelo tamanho do desafio. De acordo com estimativa da própria Secretaria de Meio Ambiente do Estado, 95% desse desmatamento foi ilegal – somente 5% dos cortes observados tiveram autorização do órgão –, o que dá a dimensão do problema que tem de ser resolvido em apenas 4 anos para que seja cumprida a meta apresentada pelo governador Pedro Taques (PDSB) em Paris.
Uma análise feita pelo Instituto Centro de Vida, ONG ambientalista baseada no Mato Grosso, observou ainda que a maior parte do desmatamento registrado no Estado ocorreu em propriedades privadas que fizeram o Cadastro Ambiental Rural (64%).
O CAR é um programa nacional, integrado, no qual donos de terra registram os dados dos seus imóveis, como área ocupada com produção e o que resta de vegetação. Foi criado na reforma do Código Florestal como um instrumento para ajudar a conter o desmatamento, uma vez que por meio dele é possível cruzar imagens de satélite com as informações prévias do local.
Sem efeito. O fato de proprietários de terra estarem derrubando a mata mesmo depois de terem feito o CAR chama a atenção dos ambientalistas.
“Esse dado mostra que o CAR não está servindo para segurar o desmatamento. No MT, 90% das propriedades têm CAR, mas isso não está fazendo a menor diferença. Acho que mais que uma expectativa, há por parte dos donos de terra uma certeza de impunidade. Eles fazem apenas para cumprir a regra, mas não dão importância, acreditando que terão anistia mais para a frente”, afirma Sérgio Guimarães, da coordenação do ICV.
A análise feita pela ONG destaca também que a maior parte do corte raso em terras privadas, 73%, ocorreu nas médias (até 1.500 hectares) e grandes (maiores que 1.500 ha) propriedades. Para Guimarães, esse é outro sinal da crença na impunidade por parte do setor, já que os grandes terrenos ficam mais visíveis para a fiscalização.
“Um grande proprietário voltar a desmatar faz isso como um ‘investimento’. Ele tem certeza da impunidade e está abrindo mais áreas”, diz.
De agosto de 2014 para julho de 2015 o desmatamento no Estado já tinha sofrido um aumento de quase 50%. Diante desse quadro, aponta Guimarães, a queda de 6% é praticamente um resultado de manutenção. “É um patamar muito alto. Não dá para dizer que houve uma ação do Estado para limitar isso. Ainda mais para quem pretende zerar o desmatamento ilegal – e quase todo ele é ilegal – até 2020”, critica.
Alguns dias antes da divulgação do Prodes, a Secretaria de Meio Ambiente divulgou um plano de metas com 20 medidas que serão tomadas para a redução da perda. Num cálculo próprio, e diferente do feito pelo Inpe, o Estado alega que houve queda de 19% – os números oficiais, porém, são os do Prodes, cujo resultado final sai somente em meados do ano que vem. Este de agora é ainda uma estimativa.
Nos últimos, no entanto, os números finais do Prodes têm sido ajustados para cima. A estimativa inicial do corte raso entre agosto de 2014 e julho de 2015 para o MT, por exemplo, tinha apontado os mesmos 1.508 km² de agora, mas a atualização divulgada em setembro deste ano fez a taxa estadual saltar para 1.601 km².
Por meio de nota da assessoria de imprensa, o vice-governador do MT, Carlo Fávaro, que acumula desde maio a Secretaria de Meio Ambiente, afirmou que, apesar da queda, não está satisfeito e vai intensificar as ações de monitoramento, fiscalização e responsabilização aos crimes ambientais em 2017. Uma das medidas, disse, é montar uma base do Estado em Colniza, município que está em primeiro lugar no ranking do desmatamento nos últimos 5 anos.
“Não estamos querendo comemorar os 19% de redução, nós sabemos que há muito a ser feito, medidas importantes vão ser tomadas em 2017 para melhorar. A nossa meta de redução para o ano que vem é de 30%. Como vamos fazer isso? Intensificando o monitoramento e a fiscalização, principalmente, nos 10 maiores municípios com as maiores áreas de desmatamento.”
Acre. O Acre também anunciou que vai também contestar os dados do Inpe. Em nota, o secretário de Meio Ambiente do Estado, Carlos Edegard de Deus, alegou que “uma série de políticas públicas para redução do desmatamento foram implementadas neste período, como ações de comando, controle e fiscalização ambiental associados à ampliação de políticas para agricultura familiar visando a intensificação do uso de áreas já desmatadas”.
Fonte: Estadão