Potencial do produto no Brasil pode suprir toda a demanda de gás natural e 80% do diesel. Avanços no setor regulatório, viabilidade econômica para o produtor e oferta de assistência técnica podem alavancar a produção
O potencial do biogás no Brasil, a participação do agro nesse mercado e os desafios para a ampliação do uso dessa energia renovável no país foram debatidos em live do projeto Conexão Brasília, na noite dessa terça-feira, 10. Representantes do governo, da agroindústria e dos produtores abordaram como o biogás pode ampliar ainda mais a sustentabilidade da agropecuária e os caminhos para juntar vantagens econômicas e ambientais. A live é uma parceria da Frente Parlamentar da Agropecuária com o Canal Rural.
Siga-nos: Facebook | Instagram | Youtube
O gerente de Bioeletricidade da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Única), Zilmar José de Souza, destacou que o biogás pode aumentar ainda mais a importância do setor sucroenergético como fonte de energia renovável no Brasil. Ele citou dados da Abiogás (Associação Brasileira de Biogás) que apontou potencial de produção de 120 milhões de metros cúbicos por dia do produto. E, hoje, informou, apenas 2% desse volume é utilizado.
“Esse potencial seria suficiente para suprir toda a demanda de gás natural do Brasil ou substituir cerca de 80% do consumo de diesel do Brasil. E, desse potencial, o setor sucroenergético responde por quase 50%. É o grande pré-sal caipira”, pontuou o gerente da Única. O setor sucroalcooleiro com o bagaço, torta de filtro, a vinhaça é um dos mais importantes fornecedores de matéria-prima para produção do biogás. A produção animal, como a suinocultura, também tem oferta de resíduos que podem originar a energia limpa.
Soja em sucessão à aveia-preta e ao trigo pode ter produtividade 54% maior
O biogás também pode ser utilizado para geração de energia elétrica. Nesse caso, explicou Zilmar Souza, o produto apresenta um potencial de 182 mil gigawatt/hora. “Isso representa mais de duas vezes a produção da usina de Itaipu no ano passado, a primeira em geração de energia elétrica no mundo. Daria para atender o Distrito Federal por 30 anos”, exemplificou. No entanto, em 2019, a geração pelo biogás foi de somente 18 gigawatts/hora.
O secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), José Mauro Coelho, mostrou a evolução do biogás nos últimos 10 anos. A oferta interna, disse, cresceu 40% ao ano entre 2010 e 2019. Hoje, há 533 plantas de produção, um aumento de 300% em relação a cinco anos atrás. Coelho, por outro lado, também reforçou a diferença entre o potencial e a produção de biogás. A oferta interna de energia relacionada a esse produto é de apenas 0,1%.
“O que nos mostra o grande potencial que o país tem. Vemos o biogás como um energético que tem uma capilaridade da oferta nesse país de dimensões continentais”, ponderou o secretário ao lembrar que a produção de gás natural interna está muito concentrada na costa brasileira. Por isso, a fonte renovável se mostra como alternativa de desenvolvimento regional e oferta descentralizada, acrescentou José Mauro Coelho.
Como avançar
Mas, como alcançar esse potencial no Brasil? O gestor do MME enumerou algumas ações do governo, que segundo ele, vão estimular a produção nacional de biogás. Há alguns anos, o produto não constava no Plano de Expansão de Energia (PDE), publicado todo ano e elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao MME. “O biogás hoje já está inserido no planejamento energético brasileiro seja na parte relacionada a energia elétrica seja na parte relacionada aos biocombustíveis”, afirmou.
Ele ainda mencionou avanços nas regulações federal e estaduais. Um deles veio com a Política Nacional de Biocombustíveis – Renovabio, instituída pela Lei 13.576/2017. Coelho explicou que essa política tem a finalidade de estimular a produção e uso de biocombustíveis na matriz de transporte brasileira. “E um dos principais beneficiados com essa política pública é o biogás”, atestou.
O secretário do Ministério de Minas e Energia completou que se usinas de etanol ou biodiesel passarem a usar o biogás ou biometano na sua frota de veículos em vez do diesel, essas indústrias terão sua nota de eficiência energética ampliada. “Com essa nota de eficiência energética maior, ela vai poder emitir mais o CBIOs, os créditos de descarbonização, que serão comercializados na bolsa de valores e que retornam como mais um ativo para o produtor de biocombustível”, esclareceu.
Zilmar Souza também mencionou o Renovabio como uma iniciativa importante nesse contexto. Já do ponto de vista da energia elétrica, o gerente da Única disse acreditar que após a conclusão da reforma do setor elétrico haverá maior incentivo ao uso dessa fonte de energia que passará a ser mais competitiva. “Esse bom cenário tenho certeza de que vai estimular cada vez mais investimento em biogás. Mas, ainda há muita coisa a ser feita”, declarou.
Pelo olhar do produtor rural, o coordenador de Tecnologia da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Reginaldo Minaré, alertou para a importância do controle de custo ao se optar pela produção de biogás numa propriedade.
“A alternativa é interessante, mas depende do modelo de negócio de cada agricultor. Sempre que o agricultor tem a possibilidade de agregar ao seu portfólio de produção algum produto que destine uma certa vantagem é sempre muito bem-vinda essa tecnologia”, argumentou o representante da CNA.
Minaré detalhou que deve ser levado em conta o porte da propriedade, tipo de cadeia produtiva, já que o agro é muito diversificado. Ele deu como exemplo a suinocultura que está mais presente no sul e é fornecedora de matéria-prima para o biogás. O coordenador da CNA lembrou que se tratam de propriedades de até 100 hectares, em sua maioria. E, por isso, é preciso avaliar que equipamentos usar, se vai comercializar a energia ou usar apenas internamente, custo de manutenção, instalação, se é vantajoso perante o combustível ou energia elétrica adquirida.
Na sua visão, são necessárias algumas etapas para que o biogás seja competitivo para o produtor. Uma delas é a mudança de cultura de produção. “Não dá para falar de uma produção esporádica, temos que ter regularidade. Então, temos que ter uma estrutura que pavimente um comércio adequado para esses produtos”. Outra questão na sua opinião é a acessibilidade do mercado de créditos de carbono para pequenos produtores.
E, um terceiro item, é a oferta de assistência técnica focada no tema. Para Minaré, essa capacitação mais específica vai ocorrer a partir de um trabalho junto as universidades e escolas técnicas para que técnicos agrícolas e engenheiros agrônomos saiam com a visão dessa alternativa dentro das propriedades. Tudo isso agregado as políticas de incentivo e da regulamentação do setor. “Tendo esse ´enforcement´ do governo, provavelmente, uns quatro, cinco anos serviriam para consolidar essa prática”, apostou Reginaldo Minaré.
AGRONEWS BRASIL – Informação para quem produz