Passados mais de três meses do início do programa de subsídio ao diesel, a Petrobras ainda não recebeu um centavo dos valores prometidos pelo governo federal, enquanto aguarda até 2,5 bilhões de reais em subvenções que já teria direito, ao passo que a maioria de suas concorrentes no setor reduz importações do combustível para não incorrer em perdas.
Nesse cenário, a Petrobras precisou ainda elevar a produção de diesel e já responde por mais de 90 por cento das importações do combustível, uma vez que precisa garantir o abastecimento interno, enquanto importadoras privadas cortam suas operações, alegando que não compensa comprar o derivado de petróleo no exterior com a atual metodologia de cálculo das subvenções.
A Petrobras espera receber de 2 bilhões a 2,5 bilhões reais de subsídios da reguladora de petróleo do país, a ANP, dentro de duas semanas, para compensar o fato de estar segurando as cotações nas refinarias, disse diretor-executivo financeiro e de relacionamento com investidores da estatal, Rafael Grisolia, em entrevista à Reuters publicada nesta segunda-feira.
Ele não entrou em detalhes sobre possíveis perdas sofridas pela empresa no período pelo atraso nos pagamentos, enquanto a ANP diz que a demora para quitar as subvenções se deve ao grande número de notas fiscais que têm de passar por checagens –o governo separou no orçamento 9,5 bilhões de reais para subsídios ao diesel até o fim do ano, quando termina o programa.
Se enfrenta uma demora no recebimento dos subsídios, a Petrobras verificou um ganho de mercado no Brasil, na medida em que suas concorrentes privadas estão menos atuantes.
Uma fonte de uma empresa do setor de combustíveis afirmou à Reuters que o programa está prejudicando a competição no país e afastando os necessários investimentos para ampliação da oferta.
“O programa de subvenção, do jeito que está, está acabando com a competição na importação. Colocando todo o mercado somente na Petrobras, e a própria Petrobras não está tendo lucratividade… a culpa é da morosidade… se os pagamentos estivessem sendo feitos, você tornaria o cenário menos incerto”, afirmou a fonte, na condição de anonimato.
“Tudo isso vai trazer preço mais caro na bomba, risco de desabastecimento, incerteza… não consigo enxergar quem está se beneficiando nessa história.”
O programa prevê que produtoras e importadoras de diesel reduzam preços de venda em troca de serem ressarcidas pelo governo em até 30 centavos por litro –uma resposta à histórica greve de caminhoneiros em maio contra os altos preços do diesel.
Contudo, após uma mudança no preço de referência do programa de subsídio ao final de agosto, houve uma alta média de 13 por cento no combustível na refinaria da Petrobras, e nas bombas a cotação da última semana já alcançou 3,638 reais, valor acima até da média registrada antes da greve dos caminhoneiros, de 3,595 reais por litro, mesmo com o programa de subsídios.
Além da Petrobras –que detém quase 100 por cento da capacidade de refino do Brasil–, algumas empresas importadoras e pequenas refinarias aderiram ao programa no início. Até o momento, no entanto, a ANP realizou pagamentos pequenos, de 185.749 reais.
A Petrobras vem afirmando que permanece com as margens de lucro preservadas na área de abastecimento. No entanto, também reconhece que vem precisando aumentar a oferta do combustível no país devido a uma debandada de concorrentes que não conseguem mais obter rentabilidade desde o lançamento do programa.
“As margens de lucro da Petrobras nas importações estão preservadas, na medida em que a companhia aplica preços para o diesel alinhados à paridade internacional, conforme dispõe sua política de preços para o derivado”, disse a empresa em resposta a perguntas da Reuters.
Ao contrário de suas concorrentes, a petroleira defende que o programa “gera resultados aderentes ao esperado pela política de preços da Petrobras vigente”.
“Vale destacar que a companhia possui infraestrutura logística eficiente, que permite ser mais competitiva que eventuais concorrentes”, disse a Petrobras.
PREJUÍZOS DA IMPORTAÇÃO
Mas a fórmula da ANP não permite que as empresas sejam devidamente remuneradas, disse o presidente da associação que representa as distribuidoras de combustíveis Plural, Leonardo Gadotti.
“A conta não fecha. A fórmula (da ANP) foi atualizada de acordo com o que se pedia, que era que se considerassem os custos de logística e internação… atualizaram a fórmula só que os valores… estão abaixo do que na prática se paga pelo mercado. Então… isso está inibindo as importações”, disse.
“É lógico que vai chegar um momento em que vai ter que existir uma saída para isso, porque o Brasil não produz 100 por cento do diesel que consome”, acrescentou Gadotti.
O presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), que representa nove importadoras, Sérgio Araújo, afirmou que a expectativa agora é zerar as importações.
“Não tem como importar”, ressaltou.
Prova desse cenário, as importações de diesel pelo Brasil caíram 42 por cento desde o início do programa de subsídio ao combustível, em junho, até o mês passado, ante igual período do ano anterior. Não ficou clara a participação da Petrobras nessas compras.
A fonte do setor de combustíveis disse também que, diante da dificuldade de importar, distribuidoras estão precisando demandar volumes adicionais à Petrobras, que tem atendido aos pedidos, mas “já com alguma dificuldade”.
Questionada sobre o crescimento da responsabilidade da Petrobras, a ANP afirmou que “não há qualquer risco de desabastecimento de diesel”.
O movimento vai na contramão do que defendia o ex-presidente da Petrobras Pedro Parente, que buscou até seu último dia reduzir a responsabilidade da petroleira estatal em garantir o suprimento de combustíveis no país.
Ele renunciou logo após o governo lançar o programa de subvenção, em meio a uma série de pressões políticas.
“A intervenção que foi feita no caso do diesel é da pior qualidade, técnica e política. Além disso você não estruturou uma saída desse problema”, disse o ex-diretor da ANP Helder Queiroz, para quem a Petrobras, como monopolista, segue como responsável em última instância pela garantia da segurança do abastecimento.
Diante de preços mais altos do petróleo, um novo governo pode voltar a enfrentar os desafios de reajustes expressivos no diesel, uma vez que o programa se encerra ao final de 2018.
(Por Marta Nogueira, com reportagem adicional de Simon Webb e Devika Krishna Kumar, em Nova York)
Fonte: Reuters