Este e outros assuntos foram tratados no Seminário “Desafios e Perspectivas do Agronegócio Brasileiro”, realizado pela FGV IBRE, em São Paulo.
“Commodity não é produção primária. Quero reforçar isso na abertura deste painel porque é algo que tenho ouvido muito e que não corresponde à verdade. Há muito valor agregado naquilo que produzimos tanto para o mercado interno quanto para o externo. E produzir commodities não é demérito algum”, foi assim que Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), abriu o ciclo de palestras do 1º Seminário Desafios e Perspectivas do Agronegócio Brasileiro, realizado hoje (16), em São Paulo, pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE). “O futuro dessas commodities passa por várias questões que serão discutidas hoje aqui”, completou.
Para falar sobre alguns destes pontos e sobre seus impactos no agronegócio, a mesa foi composta também por Celso Vegro, diretor técnico do Instituto de Economia Agrícola (IEA) e por Fernando Lobo Pimentel, sócio-diretor da Agrosecurity Consultoria e da Agrometrika Informática. “Há uma tendência secular de queda de preço de commodities. E isto é natural porque a tecnologia faz com que isso aconteça”, disse Celso Vegro.
Falando a respeito das diferenças entre o Eixo Pacífico e o Eixo Atlântico, sobretudo o Brasil, em relação a questões como disponibilidade de terras agricultáveis, água, condições climáticas etc, Vegro ainda destacou aspectos como o que chamou de ocidentalização dos hábitos de consumo. “O consumo de proteína animal, fibras e bebidas tem crescido exponencialmente no Pacífico”, disse.
Protecionismo comercial aliado ao contexto geopolítico em que nos encontramos – crises de natureza política, questão dos refugiados, avanço de viés conservador – também foram apontados por Vegro. “Esta tendência mundial ao protecionismo só aumenta o grau de incertezas nos negócios. O que precisamos, na verdade, é buscar o desenvolvimento por meio do comércio”, disse.
Apesar de enxergar uma onda de oportunidades para o Brasil nesta contextualização, Vegro chama atenção para os riscos. “Há um déficit brasileiro com a importação de fertilizantes e isso não pode ser ignorado. A falta de capacitação da mão de obra é outra questão importante”, reforçou.
Financeirização da agricultura
“No mundo todo, quem financia a agricultura é o sistema financeiro. Aqui no Brasil, temos um modelo matricial. O crédito comercial representa mais de 50% das operações no País. Sob o ponto de vista jurídico, trata-se de um modelo complexo”, disse Fernando Lobo Pimentel.
“É um modelo que tem seus vícios e virtudes. Em 2008, o Brasil passou intocado pela crise econômica; em 2013/2014, a agricultura, ao contrário de outros setores, cresceu. Isso porque tem uma estrutura muito peculiar”, disse. “No nosso sistema financeiro, o que falta é o seguro. Não há sinistro por causas naturais; o que é equivocado e injusto”, lamentou Pimentel.
“Aqui no Brasil, o banco foge do agricultor porque ele não tem seguro. O que acontece é que empresas como Bayer, Basf, Monsanto, Yara, Bunge, agroindústria e cooperativas, por exemplo, acabam atuando como bancos”, disse.
Por conta deste modelo de crédito cada vez mais privatizado, Pimentel falou também sobre a necessidade de as cooperativas se reinventarem, já que acabam perdendo muito com isto. “Além disso, há a presença cada vez mais forte de empresas chinesas no campo, o que gera competitividade”, disse.
De acordo com ele, a situação traz alguns desafios, como melhoria de governança de crédito, integrando operações comerciais e bancárias; ampliação da oferta de seguro rural; melhoria nas vias de escoamento; posicionamento diplomático para fazer frente a medidas protecionistas; aperfeiçoamento da segurança jurídica nos âmbitos trabalhista, ambiental e tributária para o agricultor empresarial. “Nós crescemos de forma caótica nesta questão de crédito para o agronegócio”, afirmou.
“Para que tenhamos o salto de crescimento em produção que se espera, precisaremos revisar este modelo”, alerta. “É inadmissível que se gaste hoje R$ 20 mil por um carimbo em cartório para uma CPR (cédula de produto rural) ou que seja necessário rodar 20,30 Km para se fazer um registro. Isso trava os negócios. Tudo precisa ser automatizado para que as coisas sejam feitas de forma fluida e mais moderna”, defende.
Fonte: Cenário Agro